Ser sensível nesse mundo requer muita coragem. Muita. Todo dia.
Esse jeito de ouvir além dos olhos, de ver além dos ouvidos, de sentir a
textura do sentimento alheio tão claro no próprio coração e tantas vezes até
doer ou sorrir junto com toda sinceridade. Essa sensação, de vez em quando, de
ser estrangeiro e não saber falar o idioma local, de ser meio ET, uma espécie
de sobrevivente de uma civilização extinta. Essa intensidade toda em tempo de
ternura minguada.
Esse amor tão vívido em terra em que a maioria parece se assustar
mais com o afeto do que com a indelicadeza. Esse cuidado espontâneo com os
outros. Essa vontade tão pura de que ninguém sofra por nada. Esse melindre de ferir
por saber, com nitidez, como dói se sentir ferido.
Ser sensível nesse mundo requer muita coragem. Muita. Todo dia.
Essa saudade, que às vezes faz a alma marejar, de um lugar que não se sabe onde
é, mas que existe, é claro que
existe. Essa possibilidade de se experimentar a dor, quando a dor chega, com a
mesma verdade com que se experimenta a alegria.
Essa incapacidade de não se admirar com o encanto grandioso que
também mora na sutileza. Essa vontade de espalhar buquês de sorrisos por aí,
porque os sensíveis, por mais que chorem de vez em quando, não deixam adormecer
a ideia de um mundo que possa acordar sorrindo. Pra toda gente. Pra todo ser.
Pra toda vida.
Eu até já tentei ser diferente, por medo de doer, mas não tem jeito:
só consigo ser igual a mim.
— Ana Jácomo.